O dia escureceu mais cedo. Divertida, pensou que o dia poderia ter sido mais longo se a preguiça matinal lhe tivesse permitido levantar da cama. O dia teve as mesmas horas de sempre, ela é que se permitira ficar na cama mais tempo.
Enquanto fechava a janela do quarto, olhou para o horizonte, enquanto Mozart ecoava pela casa quase vazia.
Escurecia. A cama aberta lembrava-a que, à noite, deitar-se-ia, de novo, sozinha. E lá fora continuava a escurecer. Já não sentia medo do escuro, nem receava que um monstro saltasse do armário... sentia, sim, cócegas de solidão.
Sentiu um arrepio estranho. Como se a noite lhe tivesse entrado pela casa dentro e tivesse absorvido o calor que havia entrado pela janela durante todo o dia. Tentou distrair-se, abster-se do sussurro da noite. Aquela escuridão, que saltitava à sua frente, não a deixava tranquila.
Se, ao menos, ele ali estivesse.
Se estivesse, gozava com aquela noite malvada. Reduzi-la-ia ao ridículo. E não deixava que a noite atormentasse um serão que se queria tranquilo.
E se eu lhe telefonasse? não. Seria a solução mais fácil. E ela era uma mulher. Não uma criancinha assustada.
O telefone tocou.
Queria ouvir a tua voz hoje. Como foi ele adivinhar?!
Foi mais cedo para a cama. Sem medos, porque embora longe, ele estava ali. A afastar as cócegas da solidão e a aquecer a noite. E a cama vazia de um corpo.